concedi-me a concretização daquele desejo. uma assombração que me perseguiu demasiado tempo a par do crescimento dos hotéis que me faziam acreditar que a cidade transbordara os seus limites. o compasso do tempo foi sempre o mesmo mas a rapidez dos acontecimentos novos pareciam encurtá-lo. faço um esforço para não repetir que tudo passa rapidamente demais para uma única vida.
mas concedi-me, finalmente e sem planos pormenorizados, a concretização desse desejo. e escolhi o hotel, no mais alto lugar junto ao céu e uma vista de rio que seria um desperdiçar de alma se deliberadamente a ignorasse.
tudo o resto foi silêncio. ninguém soube que a noite que me concedi entre cigarros e escrita imparável se fez naquelas quatro paredes frente ao azul escuro infinito do céu e ao espelho de água de uma lua que quase totalmente redonda fez questão de iluminar.
não sei como enganei o tempo e porque razão ninguém me fez mais perguntas do que as naturalmente habituais: onde vais, com quem ficas, a que horas chegas, queres ficar em minha casa. por isso e mais ainda fui. coração livre, alma branca e vazio de consciência. na minha maior liberdade, concretizei o único desejo que alguma vez me concedi como presente de natal.
"luz de inverno", Ingmar Bergman. 1962.
*retirado do filme com o mesmo nome.
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