domingo, 29 de dezembro de 2013

"A redescoberta da natureza, das árvores, dos rios, das termas, das fontes, do silêncio, é a grande alternativa à massificação, ao ruído, ao exibicionismo, ao efémero, que engodam a sensibilidade das pessoas"

Natália Correia

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

sem justificação.

       justifica-se pensando que as coisas erradas não podem estar assim tão menos certas porque para lá do seu umbigo tudo está torto.
     justifica-se acreditando que os passos atrás são afinal, como sempre foram e serão, sintomas inegáveis de crescimento e que lá chegará o tempo em que tudo fará sentido. para os outros, incompreensíveis criaturas da sua inegável sensibilidade e transcendência.
     justifica-se assim, que o tempo entretanto passou, aquela altura já não será tanto a de antes, a luz do cabelo há-de por certo apagar, mesmo a exuberância que o colhe melhor deixará de ter poder. a cor dos seus olhos será nesse arrastado momento a sua única salvação, a mesma dos velhinhos queridos e enrugados que um dia também o foram. e o egoísmo que carrega, o amortecedor para não ter que ver mais do que aqueles dois centímetros para além do seu nariz.

domingo, 22 de dezembro de 2013

o Rio é lindo demais para ser visto a preto e branco.

 este é o Rio que eu guardo dentro de mim. já longe. em modo muito nostálgico deu a mão à cidade de Marraquexe, a grande paixão da minha vida. em cor, sons, cheiros e gentes, ficam as minhas duas cidades ligadas pelo total antagonismo, seladas pela minha emoção. tudo o que se lhes compare dispensa a comparação. porque é único.

      Raul Seixas cabe neste quadro que me ficou. em todas as imagens que consegui trazer. retidas na frugalidade da minha vivência.
      oiçam-no para poderem ver como eu vi. 















     

















quinta-feira, 19 de dezembro de 2013


    
     estava no Brasil quando percebi a sua morte que calou por cinco minutos, talvez, o desassossego em que me encontrava. a vida de muitos anos trazida por quem preenche ricamente o presente nunca é longa demais. partir deste mundo é, para quem aqui fica e em manifesto ato de egoísmo, uma enorme injustiça.
     Nadir Afonso faz parte da minha vida há muito tempo por ter as paredes de casa dos meus pais pintadas na medida do seu grandioso talento. recebi depois, num longínquo natal, já casada, de presente do meu marido uma serigrafia dele, Nadir, que me deixou embargada.
     hoje sonhei com ele. vivo e a pintar. ao meu lado. numa casa atelier projetada sobre um imenso areal que morria no mar. uma casa circular, como uma tenda de circo, preenchida pela parafernália de instrumentos que a ocupavam, passou naquele tempo de convivência sonambular a ser minha também.
     havia sido contratada como sua assistente sem perceber porquê, se os pintores não têm assistentes e eu, ainda por cima, com uma família em minha casa, à minha espera e uma profissão para continuar.  não haveria disponibilidade para lhe passar os pincéis e limpar toda a tinta do chão que tombava, via eu muito bem, a partir da  pequena escadaria bem no centro dessa casa. tudo branco e rosa. aquele rosa da serigrafia onde ele se eterniza na minha sala.
    há também diálogos maravilhosos que fomos tendo nesse percurso noturno em vez de observações silenciosas que muitas vezes os meus sonhos têm.
    talvez tenha sido a minha homenagem a uma forte figura de aparência frágil que a arquitetura transferiu em singular beleza para a pintura.
   
     e acordei assim, cansada.

sábado, 7 de dezembro de 2013


Supõe

Ana Luisa se a guarda cochila
Eu posso penetrar no castelo
E galgar a muralha de onde se divisa
O vale, os prados, os matos,
os montes, as flores, as fontes
Luisa



Ana Luisa
Eu fiz esta canção pra você
Que pergunta
Precisa saber
Onde anda Luisa
Luisa
Luisa
Luisa
Por que me negas tanto assim a primavera ?
Se sabes que a última quimera
Existe no mundo de Ana Luisa
Primavera, Ana Luisa
Teus olhos
Em que lago, em que serra, em que mar se oculta ?
Escuta, Luisa
Na brisa uma canção fala em você
E pergunta
Insiste em saber, onde anda Luiza
Luisa
Luisa
Luisa
Luiza
Eu te amo tanto
Quem há de resistir a todo encanto
Que existe, assiste, em Ana Luisa

Tom Jobim


     "Ana Luíza foi uma moça bonita que apareceu no Antonio's, num dia que estava chovendo. Ela correu para aquela varandinha do Antonio's. Era uma moça alta, grande, uma grande moça e uma moça grande. Estavam lá Chico Buarque, Carlinhos de Oliveira, uma quadrilha imensa. Chico começou a falar com aquele riso dele, aquelas palavras incríveis e depois a chuva passou e ela foi embora."

Tom Jobim

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

     atravessar o oceano. nove horas e meia entregam-me ao verão, deixando por aqui o inverno, neste canto, aquecido pela caldeira aflita dos responsáveis. nove horas e meia de milhares de kilómetros e milhões de centímetros cúbicos de água a separar dois irmãos. um velho. outro novo. quatro irmãos. dois novos dois velhos dois velhos dois novos. muitos irmãos. um colorido metido num outro esbranquiçado, ora terra ora mar, para sempre fadado ao esquecido. ao esquecimento que ninguém lhe assente. ao presente que o fizeram renascido.