quinta-feira, 27 de abril de 2017

em todas as ruas te encontro




Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto, tão perto, tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco

Mário Cesariny, "Pena capital"


sexta-feira, 21 de abril de 2017

     não sei se me apetece o recolher obrigatório, o descer das minhas saias abaixo do joelho e o lenço preto a tapar-me os cabelos de igual cor, tão longos que, esticados, me tocam no fundo das costas onde começam os indícios de maior beleza, segundo cedo descobri pelo António, o meu primeiro e único amor até ontem quando abri os olhos acordada e percebi que o amor não precisa de ser impingido, muito menos fingido. 
A do éMe. 

lisboa. março ou abril de dois mil e dezasseis.