dezanove anos frescos quando li Al Berto pela primeira vez. numa biblioteca, um livro escolhido ao acaso, retirado de uma prateleira a meia altura. um poema que não identifico. apenas o Medo e a capa permanecem na minha memória. mais tarde comprei a 1ª edição dos Diários da Assírio e Alvim e a meio deste mês, o Medo.
ler Al Berto é sentir a sua inquietação profunda e acompanhar-lhe a vida breve. conhecer-lhe os amigos e tentar adivinhar os amores que ocupavam a sua surpreendente alma, percorrer alguns lugares conhecidos, desfasados no tempo.
"Quando em pequeno ouvi contar que Deus se escondia por todo o lado, nas águas do tanque de lavar roupa, no poço, na folhagem espessa do loureiro, na terra húmida, nos canteiros de flores, no cimo das árvores. Pareceu-me que o lugar mais provável era o cimo das árvores, não sei porquê, nunca consegui encontrar explicação. Deus está no cimo das árvores e não nos outros lugares que me tinham dito. Achei exagerado que Ele estivesse em todo o lado. Quando conseguia, subia às árvores, ficava acocorado na folhagem, em silêncio, e esperava que Deus se me revelasse.
ler Al Berto é sentir a sua inquietação profunda e acompanhar-lhe a vida breve. conhecer-lhe os amigos e tentar adivinhar os amores que ocupavam a sua surpreendente alma, percorrer alguns lugares conhecidos, desfasados no tempo.
"Quando em pequeno ouvi contar que Deus se escondia por todo o lado, nas águas do tanque de lavar roupa, no poço, na folhagem espessa do loureiro, na terra húmida, nos canteiros de flores, no cimo das árvores. Pareceu-me que o lugar mais provável era o cimo das árvores, não sei porquê, nunca consegui encontrar explicação. Deus está no cimo das árvores e não nos outros lugares que me tinham dito. Achei exagerado que Ele estivesse em todo o lado. Quando conseguia, subia às árvores, ficava acocorado na folhagem, em silêncio, e esperava que Deus se me revelasse.
Um dia surpreendi uma ave no ninho, e, repentinamente, suspeitei que
deus se escondesse dentro dum ovo. A ave tinha voado para longe,
assustada. Agarrei no ovo e trouxe-o para casa. Assim o conservei muito
tempo, dentro duma caixinha de cartão, em cima dum pedaço de algodão.
Vigiei-o noite após noite, até que o esqueci. Deixou de me surgir em sonhos, o ovo, e deus.
Alguns anos depois encontrei, numa gaveta de uma secretária velha, a
caixinha com o ovo dentro aparentemente intacto. Mal lhe toquei o ovo
desfez-se, tinha um cheiro a podre, execrável, tal como deus, a pouco e
pouco, foi apodrecendo no meu coração."
in Diários.
in Diários.